Tuesday, September 15, 2009

Tudo culpa do Pereira

Conheci Pereira na Lapa-Louca e logo vimos que nos daríamos bem, pois ele gosta de samba, da boemia carioca e, além de tudo, é cineasta. Aliás, não consigo dizer isso sem lembrar da querida Julieta Brandão, que uma vez na mesa de bar, num desses inferninhos da Lapa, ouviu alguém dizer que Pereira cantava mal. Julieta, indignada e belíssima cantora, disse bem alto: claro que ele não canta bem! ELE É CINEASTA!

E o cineasta me recomendou assistir a dois filmes: o primeiro, Anticristo. Depois, quarta-feira passada, chegou empolgadíssimo dizendo que Os Amantes era o filme do ano. Resolvi matar dois coelhos numa cajadada só e hoje fui até o Arteplex, em Botafogo, fazer uma dupla sessão.

Às 19:40, depois de um café, assisti ao Anticristo. Eu já temia pelo filme, sabia que era meio macabro, mas, mesmo assim, fiquei curiosa e sempre fui corajosa para tais filmes. O longa conta a história de um casal que, devastado pela morte de seu único filho, se isola em uma cabana, no meio da floresta, onde coisas bizarras - e coloca bizarro nisso - começam a acontecer. O filme é dividido em capítulos e tem uma fotografia muito boa, em destaque, a primeira cena. No entanto, eu tive uma crise de ansiedade horrorosa quando o filme foi chegando ao final. Vi três pessoas saírem no meio da sessão e, juro, quase fui junto. Foi o primeiro filme que me deixou aterrorizada. Não por conter cenas de sangue, que nem são tantas para um filme dito de terror, mas pelo peso psicológico da trama. Fiquei mal mesmo. Até me arrependi de já ter comprado o ingresso de Os Amantes, que ia começar logo em seguida. Saí da sala com uma puta ansiedade e depois de trocar algumas mensagens com minha mãe, me acalmei e fui ao segundo filme.

Os Amantes conta a história de um cara bipolar que aos trinta e cinco anos está morando novamente com os pais e se envolve com duas mulheres. O filme é bom pra caralho, não o melhor do ano, como disse Pereira. Mas ainda estava abalada psicologicamente por causa do Anticristo e entrar de cabeça na história de um cara confuso foi bem pesado.

Ao sair do cinema, fiquei na dúvida do que me assustava mais. Ficar com trinta e cinco anos e virar bipolar morando em casa, ou fazer trilha em uma floresta à noite. Voltei para Tijuca, deitei na cama depois de uma Maracujina, e não consegui dormir. O Anticristo ainda não saía da cabeça. Resolvi tomar uma sopa de pozinho, daquelas horríveis, igual a um filme de terror. Quando estava mexendo a sopa, senti algo no meu pé (estava de meias), olhei para baixo e tinha uma barata IMENSA que logo correu para debaixo do fogão. Devo dizer que aqui estamos sem faxineira há quatro semanas e a casa não se encontra em seu auge, risonha e limpída, como diria nossa musa Vanusa. Dei um grito bem baixo e abafado, pois os meninos já estavam dormindo e fui pegar meu chinelo. Logo, lembrei de Clarisse Lispector, do famoso conto da barata. Encarnei Clarisse, afinal, ali era ou eu, ou ela. Se eu não a matasse, corria o risco dela invadir meu quarto, e eu não estava a fim de dividir emoções com aquele inseto nojento. Ela logo saiu correndo novamente, três tentativas de chineladas depois, acertei-a. Dei mais duas chineladas para me certificar de que a teria matado. Quando vi aquela gosma branca, entendi que tinha chegado seu fim. Meu coração e toda ansiedade voltaram e eu ainda estou pensando se vou até meu quarto dormir, ou se cochilo no sofá da sala, com medo de outra barata. Amanhã devo tirar o dia para limpar esta casa. A barata ainda está ali, mortinha da silva. Matar foi meu máximo, retirar o defunto já é demais.

Estou agora aqui, sentada em frente a este computador depois de ver besteiras no youtube, pensando quantos medos tive de vencer hoje. Foi também hoje que, pela primeira vez, um filme me desencadeou uma ansiedade filha da puta. Eu estou sozinha no Rio de Janeiro. Vivi medos que não sei até que ponto são infundados. Uma barata é perigosa? Posso virar uma maluca de pedra e endoidecer no meio da floresta depois de uma desgraça? Terei eu trinta e cinco anos e virarei bipolar morando na casa de minha mãe? Quais são meu verdadeiros medos? Quais desses aí são verdadeiros?

Sempre tive medo de enloquecer, tenho muita raiva quando alguém me chama de maluca, tenho vinte e seis anos e ainda dependo de minha mãe e sempre, mas sempre, tive medo de baratas. Sozinha, aqui, não pude gritar e chamar alguém para matar. Sozinha no cinema, não tive com quem dividir minhas emoções ao assistir a dois filmes tão intensos. Sozinha aqui, decido meu destino. E agora acho que meu maior medo mesmo é ficar sozinha.

3 comments:

J.L.Tejo said...

"Teoria do dom" é ótimo, rs. Acho que a chave está no que você disse: "se não tivesse estudado...". Constrói-se. Dizer que nasce ou não nasce, e acabou, é de um elitismo, de um determinismo lamentável, que inclusive não corresponde ao que observamos na vida real.

Já estava com vontade de assistir "Anticristo", fiquei ainda mais instigado. Confesso que em matéria de cinema sou ainda muito restrito ao "esquemão" Hollywood, preciso corrigir isso, rs. Mas, terror por terror, a odisséia da barata foi insuperável.

Nelson Muntz said...

UAHAUAHuahaUAHuahAUhaUAHuaHAU

Baratas...

O poeta do A-HÁ!

J.L.Tejo said...

Bebel, acabei tendo que repostar o Bukowski. Faz o comentário lá de novo, rs.